Por
Jean Wyllys, na revista CartaCapital
O
"combate contra essa minoria" que o candidato Levy Fidelix propôs
ontem na TV Record já começou a dar frutos: num comentário publicado na web da
Folha de São Paulo, um sujeito chamado Alan Whitney (esse é o nome que ele usa
na rede social, não sei se é verdadeiro ou um alias) me ameaça de morte:
"Temos que destruir isso na raíz e matar Jean Wyllys", ele disse,
fazendo referência à apelação de Fidelix. Não é a primeira vez que eu sou
ameaçado e já teve um caso de um criminoso fascista e homofóbico com um plano
para me matar que foi desarticulado pela Polícia Federal, que o apreendeu.
Mas agora eu peço a vocês que fechem os olhos e
imaginem a seguinte cena: durante o debate presidencial, ao vivo, um dos
candidatos diz, referindo-se aos judeus: "Nós somos a maioria e vamos
combater essa minoria". Ou então, referindo-se aos negros, alude ao
excremento: "Aparato excretor não reproduz". Em rede nacional! Qual
teria sido a reação do moderador do debate? E a dos outros candidatos? A plateia
teria rido, como riu ontem quando o candidato Levy Fidelix usou essas expressões
para se referir aos homossexuais, como se fosse engraçado? Qual seria a
manchete dos jornais de hoje? O Ministério Público teria feito alguma coisa? E
a justiça eleitoral? Ele seria convidado ao próximo debate?
A história tem exemplos práticos que mostram as consequências dessa prédica. Adolf Hitler também achava que os judeus eram uma minoria nojenta que devia ser "combatida" e isso custou uma guerra mundial e mais de seis milhões de mortos - tanto judeus quanto homossexuais, ciganos, comunistas, deficientes e outros grupos que o nazismo escolheu como inimigos públicos do povo alemão. Não aprendemos nada?
A história tem exemplos práticos que mostram as consequências dessa prédica. Adolf Hitler também achava que os judeus eram uma minoria nojenta que devia ser "combatida" e isso custou uma guerra mundial e mais de seis milhões de mortos - tanto judeus quanto homossexuais, ciganos, comunistas, deficientes e outros grupos que o nazismo escolheu como inimigos públicos do povo alemão. Não aprendemos nada?
A
naturalização do discurso de ódio e da incitação à violência contra a população
LGBT é assustadora. E ainda tem gente que acha que tudo isso é liberdade de
expressão ou opinião. Enquanto isso, assistimos ao recrudescimento da violência
letal contra gays, lésbicas, travestis e transexuais. Nas últimas semanas,
foram vários casos. Um candidato gay do PSOL do Amapá recebeu ameaças
homofóbicas e, dias depois, uma pedrada na cabeça, e acabou no hospital. Um
menino gay de 19 anos foi sequestrado, torturado e queimado vivo durante um
"ritual de purificação" em Betim, Belo Horizonte. Sobreviveu, foi
socorrido por amigos que o levaram ao hospital e acharam ao lado dele, que
estava inconsciente, uma nota que dizia que o grupo que o atacou faria
"uma limpeza em Betim (para) trazer o fogo da purificação a cada um que
andar nas ruas declarando seu ‘amor’ bestial". Outro jovem gay de 19 anos,
em Interlagos, São Paulo, foi espancado e sofreu uma tentativa de estupro. “Você
quer ser mulher? Então agora vai apanhar como mulher”, falaram para ele. Tudo
isso em uma semana.
O
"combate" que Levy Fidelix propôs durante o debate presidencial não
é, como ele diz, da "maioria heterossexual" contra a "minoria
homossexual", porque a maioria dos heterossexuais não tem o pensamento
doentio desse canalha. Quem agride, espanca, mata e espalha ódio é uma minoria
fundamentalista e fascista - minoria, felizmente, mas altamente perigosa - que
se sente legitimada pelo discurso de ódio de pessoas como Levy, Feliciano,
Bolsonaro, Malafaia e outras figuras caricatas como eles.
O
problema não é a estupidez deles, mas a omissão daqueles que deveriam reagir
desde o governo, o parlamento e a justiça. Se o discurso de Levy Fidelix
consegue ser pronunciado em rede nacional sem causar as reações que deveria
numa sociedade civilizada, é porque o Brasil não tem políticas públicas de
promoção da igualdade, afirmação dos direitos civis da população LGBT e combate
ao preconceito que se abate sobre ela.
É
porque o governo federal cancelou o programa "Escola sem homofobia",
é porque o Congresso ainda se omite da sua responsabilidade na aprovação das
leis de casamento igualitário e identidade de gênero (ambos os projetos de
minha autoria junto com a deputada Érika Kokay), é porque a candidata Marina
jogou no lixo o programa que seu partido tinha elaborado com excelentes
propostas para a comunidade LGBT, é porque o candidato Aécio não se posiciona
diante dos escandalosos projetos homofóbicos de deputados do PSDB, como o
projeto de "cura gay" de João Campos, é porque os grandes partidos
fazem alianças com os fundamentalistas em troca de apoio eleitoral, palanques e
tempo de TV. A maioria da classe política brasileira não tem coragem de
enfrentar o discurso de ódio e continua refém da chantagem dos vendilhões do
templo.
Com
relação à Levy Fidelix, meu mandato vai entrar na justiça, junto com a
candidata Luciana Genro, para que seja punido de acordo com a legislação
eleitoral. A prédica de ódio não cabe na democracia. Mas não podemos reduzir o
problema a esa figura caricata e estúpida. Toda a dirigência política
democrática do Brasil deveria fazer já, agora mesmo, um pacto nacional contra o
preconceito e a favor da cidadania da população LGBT, com uma agenda positiva
de afirmação de direitos e políticas públicas que comprometa o próximo governo
e a próxima legislatura, independentemente de quem resultar vencedor das
eleições de 5 de outubro. É urgente e não dá mais para tolerar a omissão de
quem tem responsabilidades e poder para acabar com esta loucura.
(http://altamiroborges.blogspot.com.br/2014/09/por-que-levy-fidelix-fala-o-que-quer.html)
Nenhum comentário:
Postar um comentário